Måneskin: Rock Education (11/2020)
Não é fácil nem entrevistar uma banda de rock na época da Covid-19. A cumplicidade, as brincadeiras ou - pelo contrário - as setas provocativas são todas mais difíceis a um metro e meio de distância e as máscaras sempre no rosto para tapar o nariz e a boca. Mas é essa a situação. Felizmente os Måneskin são muito comunicativos, apesar de tudo isso.
Obviamente, no lobby do hotel em Milão onde nos encontramos não há ninguém. Os quatro vêm diretamente de seus quartos e começam a brincar uns com os outros e com a equipe.
Damiano ri que na noite anterior no programa "Che Tempo Che Fa" desamarrou a parte de trás de suas calças durante a entrevista com Fabio Fazio e, então, ele teve que mantê-la com a mão, esperando que ninguém notasse sua posição engraçada.
Ele, Victoria, Thomas e Ethan se sentam no sofá e, enquanto um deles fala, os outros o escutam em silêncio. Eles completam a resposta ou esperam sua vez para dizer o que
têm a dizer. Parece trivial, mas não é. Porque grupos onde os membros não conversam entre si ou assistem ao celular enquanto um deles se assume a tarefa de atender, há muitos no cenário musical global.
Para definir em apenas um adjetivo, os Måneskin são educados.
Educados no rock dos anos 70 pelos seus pais desde a infância, mas não necessariamente a cultura do "sexo, drogas e rock'n'roll", porque reiteraram várias vezes que nunca foram
fascinado por essa imaginação.
Em sua última balada rock, "VENT'ANNI", os jovens de dezessete anos podem ser respirados desde o primeiro nota de guitarra. Além disso, a banda romana decidiu apresentá-lo nos Palácios Imperiais no Palatino e no local, sem plateia. Imediatamente, me trouxe o pensamento de volta para a performance épica por excelência: a performance do Pink Floyd em Pompeia.
Faz apenas três anos desde a sua participação sensacionalno The X-Factor. Eles não venceram, embora muitos pensem que sim. Eles ficaram em segundo lugar, mas deixaram sua marca na capacidade de reconhecer a música, ocupar o palco e ter personalidade e estilo para dar e vender. Também deixam o inédito "Chosen" [EP] como lembrança: mais de trinta mihões de streams. Um ano depois (Outubro de 2018), veio "Il Ballo Della Vita": disco triplo de platina, com os singles Morirò da Re (duplo disco de platina) e Torna a Casa (cinco vezes disco de platina), seguidos por uma turnê europeia e, em seguida, um hiato regenerador. Um tempo para ter uma nova inspiração em Londres, e depois parar de verdade: tudo parou. Confinamento.
Então, a primeira pergunta é: como você se sente quando você não tem nem vinte anos, está no auge da vida, conquistando uma coisa após a outra, e de repente é forçado a colocar tudo em "stand-by"?
"Como qualquer um de nossos colegas", eles respondem praticamente em coro. “Aceitamos as restrições porque isso é o certo a se fazer nesse momento. Em primeiro lugar temos um senso de responsabilidade".
Alguém reparou que isso também não é uma atitude particularmente rock, visto cantores "rebeldes" como Noel Gallagher, que defendeu que obrigar o uso de máscaras seja uma privação de liberdade.
"Temos a sorte de termos podido desabafar através da música durante o lockdown, e podemos continuar fazendo isso. E, em todo caso, o senso cívico de hoje em dia é rock"
Em "VENT'ANNI" são afrontados muito temas delicados, o primeiro deles é a dificuldade de crescer mantendo as próprias diferenças: na opinião de vocês, isso foi interpretado da forma correta?
[DAMIANO]: Sim, foi entendido pelos nossos colegas, mas também por pessoas mais adultas que nos elogiaram pela forma como conseguimos expressar sentimentos que eles também sentem, talvez até com 40 ou 50 anos. Ficamos satisfeitos que tantas pessoas tenham dito que nos destacamos da música de hoje com originalidade, além de alguns comentários após a abertura da Liga dos Campeões.
Tipo?
[DAMIANO]: Coisas normais, como "O Måneskin se qualificou para a Champions League", coisas desse tipo.
[THOMAS]: Muitas pessoas usaram a palavra "Maturità" para essa nova música, e nós ficamos muito lisonjeados.
*CONTEXTO: "MATURITÀ" é um exame feito por estudantes, pode ser equiparado ao nosso vestibular, no Brasil.
Por outro lado, o que vocês acham da reação do Instagram ao censurar a foto de vocês, tirada por Oliviero Toscani?
[VICTORIA]: Por um lado, nós já esperávamos e queríamos mesmo criar um debate. Para nós, é um absurdo que censurem um nu artístico só porque um seio feminino está à vista: isso também reflete a ideia de que o corpo da mulher seja visto como uma entidade negativa. Até porque, quando publicamos uma foto com o bico do peito de Damiano aparecendo, não tivemos nenhum problema.
[DAMIANO]: E muitas vezes as "pessoas comuns" são censuradas, mas as hiper-mega-estrelas não. Também deveríamos refletir sobre isso, não é? Nós acreditamos que cada pessoa tem o direito de lidar com o próprio corpo da forma que quiser.
[VICTORIA]: Claro, e sem publicar fotos pornográficas ou ofensivas.
Em uma nova publicação, você colocaram na legenda que "vocês nos entenderão daqui a mais vinte anos".
[VICTORIA]: Era destinado aos comentários retrógrados que recebemos ou que querem falar das nossas roupas. Por exemplo, sobre o fato de eles serem garotos que pintam as unhas ou se maqueiam.
Ligado ao conceito de não ser entendido por todos, no texto de VENT'ANNI vocês dizem "Explicar o que são as cores para quem vê em preto e branco". Aconteceu com vocês de encontrar muitas pessoas na vida que não conseguem enxergar as cores dela?
[DAMIANO]: É sempre uma metáfora sobre ser diferente. Aconteceu muitas vezes, claro. Tivemos que explicar, sobretudo, até porque quisemos seguir escolhas de vida não canônicas, como a de querer viver o fato de que tocamos em uma banda - o que só é justificável para as pessoas quando você alcança resultados.
E de conhecer pessoas particularmente inspiradas?
[VICTORIA]: Claro, fomos muito sortudos, especialmente do ponto de vista profissional. Nossa equipe nos seguiu, nos explicou como funcionam as coisas e também nos acolheram no sentido afetivo.
[THOMAS]: Eu também fui muito apoiado pelos meus pais. Meu pai sempre esteve no mundo do espetáculo, e isso sempre me transmitiu uma vontade enorme de estar lá.
Musicalmente, em quem vocês mais confiam?
[TODOS]: de Fabrizio Ferraguzzo!
Se acontecer de estarmos em uma discussão de dois contra dois, ele nos ajuda a resolver. É o quinto Måneskin. Sempre falamos isso para ele. Temos uma química espetacular com Fabrizio, até porque a figura do produtor é importantíssima para nós: ele sempre nos ajudou a não perdemos a nossa natureza, e entendeu cada um de nós singularmente desde que nos conheceu no The X-Factor. É o tio legal para quem você lê uma música.
Voltando um pouco no tempo, uma para todos: vocês tiveram dúvidas sobre participarem do The X-Factor?
[VICTORIA]: Sim, claro. Parecia uma coisa muito distante para nós. Uma vez estávamos conversando com uma garota no trem e ela disse "Como assim? Vocês são loucos? Eles vão pegar vocês e trancar em uma sala sem contrato". E nós ficamos um pouco assustamos, mas aqui estamos.
[THOMAS]: Eu lembro que uma vez estávamos em um estúdio de tatuagem e tivemos uma mega discussão sobre isso com nossos amigos. E no final foi muito bem: The X-Factor não é o demônio!
Inclusive, vocês foram convidados de honra.
[TODOS]: Sim! No geral, o The X-Factor foi uma super experiência. Nós tínhamos as nossas ideias muito claras desde o início, e as levamos adiante. Ninguém tentou nos mudar.
[VICTORIA]: Manuel Agnelli também nos ajudou muito. Se voltássemos no tempo, faríamos de novo sem pensar duas vezes.
Vocês falaram de Londres como um período que os forneceu muita energia: assistiram a algum show em particular que fez com que vocês pensassem em apresentar algo novo nos seus shows?
[TODOS]: Do Yak!
[VICTORIA]: No geral, saíamos a noite para ver shows pequenos - com, no máximo, 50 pessoas, e assistíamos dois ou três em uma noite. Por outro lado, o dos Yak era mais sério, havia cerca de 500 ou 600 pessoas no ginásio de uma escola, e eles eram loucos! Fizeram o público fazer stage-diving e eles também fizeram. Quebraram uma guitarra no final, e todo mundo gritava! Foi incrível. É muito bonito ver as músicas rearranjadas para um show ao vivo. Claro que nós não podemos refazer tudo como, por exemplo, levar as pessoas para o palco, mas de resto sim.
[THOMAS]: Estamos mais preparados para improvisar no palco! Porque a dimensão live é a que nós mais gostamos.
[VICTORIA]: Para esse novo álbum, pensamos muito em como tocaríamos as músicas ao vivo.
Quais temas não podem faltar no novo projeto de vocês, e quais gêneros estarão presentes?
[THOMAS]: "Il Ballo Della Vita" foi um álbum conceitual, esse não será assim. Queremos focar ainda mais na música e nos aproximarmos de uma relação mais crua entre o "power trio" (instrumental). Queremos que a música tenha a mesma importância da voz e da letra.
[VICTORIA]: Nós experimentamos muito, e continuamos a experimentar: não nos apegamos a apenas um tipo de som. O nosso objetivo é que o nosso som se torne cada vez mais reconhecível.
[ETHAN]: Eu gosto do fato de que quando estamos na fase de composição, uma música pode nascer de qualquer um de nós quatro. A ideia pode nascer do texto, e também de um riff de guitarra, baixo ou algum ritmo da bateria. Conseguimos ter as ideias sozinhos, mas depois temos que reelaborá-las juntos.
[THOMAS]: Outro aspecto positivo é que eu e Damiano, que somos guitarrista e voz - ou seja, a linha melódica, mudamos a nossa abordagem. Muitas vezes nos distanciamos e vemos o que podemos criar, para depois voltarmos para os dois - que são a parte rítmica, baixo e bateria. Talvez a diferença do primeiro álbum é de que queríamos sempre começar a partir dos 4, e agora entendemos que isso não é necessário.
[DAMIANO]: Sim, e em um segundo momento a sala de ensaios deve ser a nossa zona de conforto, onde cada um é livre para experimentar o que quiser.
E se vocês não puderem sair, por conta de um segundo lockdown total, como fariam para continuar com o trabalho?
[VICTORIA]: Voltaríamos a nos enviar as músicas à distancia. Mas dessa vez estaríamos mais preparados, em Março não estávamos nem um pouco prontos! Ethan não estava com sua bateria em casa, agora ele já está com ela. E eu consegui recuperar os sistemas para poder gravar o baixo. As primeiras semanas foram tremendas porque não tínhamos meios para gravar músicas. Foi desestabilizante.
Agora imaginem que podem se mover para todos os lugares. Vocês se saíram bem na turnê europeia: se pudessem voltar amanhã em uma das cidades, onde seria?
[TODOS]: Londres!
[ETHAN]: Mas não só por causa dos shows, é uma cidade onde realmente vivemos muito bem.
E outro lugar
[VICTORIA]: Nós gostamos muito da Alemanha!
Um ano atrás também era lançado o documentário da banda "Il Ballo Della Vita". Vocês assistiram vários outros documentários de outras bandas de rock antes de gravar o seu próprio?
[VICTORIA]: Sim, mas independe disso. Até porque o nosso documentário é mais um "Making of" do álbum do que um documentário propriamente dito.
[ETHAN]: Nós gravamos ele para mostrar o lado mais pessoal de uma banda no seu ponto alto.
Vocês querem alcançar um estilo único e ser realmente diferentes, e vocês realmente são nesse momento na Itália. Mas no fundo vocês se referenciam muito nos anos 70, de Led Zeppelin ao Gentle Giant, de Fleetwood Mac a David Bowie. Em um certo ponto, vocês gostariam de fazer algo totalmente novo e que não tenha nada a ver com algo que já tenha sido feito no passado?
[VICTORIA]: Pensamos que realmente seja difícil inventar algo completamente novo nos dias de hoje, mas nós somos muito diferentes nas nossas referências musicais e, no final, todas essas influências refletem na nossa música. Nós gostamos muito das bases rock e adoramos inserir as linhas melódicas mais pop do Damiano, por exemplo, e até mesmo rap. Não é que "o Pink Floyd também poderia inserir esses elementos", não é isso! Pensamos e acreditamos que a nossa particularidade seja exatamente essa.
Tradução: Juliana Galvão | Portal Måneskin Brasil © 2022
Original: Silvia Danielli | Billboard Italia © 2020
Todos os direitos reservados a Billboard Italia
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